27 novembro 2008

 


Pintura de Van Gogh


CONSIDERAÇÕES SOBRE O DESAPEGO AOS SAPATOS

Quero compreender a palavra “desapego”. É uma necessidade minha. A questão não é compreender o desapego pelo calor humano. Mas sim, compreender o desapego pelas coisas produzidas pelos humanos. Isso tudo porque senti uma dor piegas ao me apartar de um par de sapatos meus. Um pouco velho, mas meu. Pois é, senti uma espécie de dor ao me desfazer de um par de sapatos. Meia vida, não necessariamente velho. Me desfiz dele dando-o a uma tia minha, para que ela desse a alguém que estivesse precisando. Sendo que eu não esperava ser acometido por um sentimento que era um mistura de sensação perda e de saudade de sapatos que sequer poderiam ter olhos para me atingir com um olhar de “nunca mais” ou braços para me confortar. Penso que em todo chão tem um pouco de cada rastro que traçamos: e nossos sapatos são nossos cúmplices e, ao mesmo tempo, comparsas nas nossas caminhadas. Os sapatos são a distância entre o que a gente pisa e o que sentimos pisar, são eles que delimitam nosso contato terreno e natural com o mundo e nosso ego.

Eu não deveria está lamentando isso. Até porque foi uma decisão própria me desfazer dos sapatos. Muito própria. Mas, sabe, sou daqueles que preferem sentir as coisas sem exatamente ter que compreendê-las. Pelo menos por algum tempo. Vi o par de sapatos ali. Um pouco velho. Tá certo, me subiu uma vontade danada de não mais usá-los. Mas também não sabia que no momento em que eu fosse me desfazer daquele par eu iria ser abordado por sentimentos desconhecidos. Vez em quando eu gosto de sentimentos desconhecidos. Eles nos movem de lugar, nos transportam a um lugar não-comum. Poucas sensações são iguais: não é fácil nomear sentimentos ou sensações as quais desconhecemos. E, determinadamente, penso que são estas coisas que nos movem mesmo, que nos fazem seguir, tocar em frente, sem conhecer estradas, caminhos, ruas, avenidas. Vai-se apenas, a mando do destino. Com ou sem sapatos. Porque o que a vida nos impõe é que a gente siga. Pois que os sapatos deixem apenas os rastros.

26 novembro 2008

 


INEXPLICÁVEL

É inexplicável. Não há como explicar o atual cenário da violência em nossa sociedade. Aqui trato da violência urbana. Se eu escrevesse aqui o episódio que aconteceu em Garanhuns por estes dias, poucas pessoas achariam que o escrito estava apenas se tratando apenas de um fato: três elementos entraram na casa de um indivíduo para vingar uma desfeita sua: não encontrando este indivíduo, assassinam a pancadas a prole (um menino e uma menina) e sua esposa. Como se não bastasse, após a prisão dos autores deste crime, mais três elementos, no intento de vingança pela prisão daqueles (há quem diga que se tratava de um ritual de magia negra), foram ao cemitério à noite, desenterram o corpo da menina, de 11 anos, e fizeram sexo com o corpo defunto. Sim, isto renderia um bom conto. Soturno, mas o enredo nos renderia um bom conto. No entanto, a coisa não é bem por aí – não é ficção, mas tão somente realidade. Penso que o escritor, apesar da reserva que lhe é salutar, deve sentir-se parte da sociedade. Ou seja, sentir-se agente da denúncia. Gritar mais. Pois percebam o quanto é importante os artistas e intelectuais se posicionarem frente à onda de violência que assola o espaço do cidadão. Percebo uma timidez muito grande da classe pensante acerca do caos que agride a paz e a serenidade na urbe. Todavia, realmente, é uma coisa sem explicação! Que é que se diz diante de uma situação dessas. Já parou para pensar aonde chegamos?: sequer depois de morto (a) agora se tem descanso. Olha o caso: estuprada viva, e estuprada ainda depois de morta. Isso é coisa humana mesmo ou são os meus poucos anos de vida que me deixam ingênuo diante de tais fatos? Por outro lado, desafio alguém a me dá uma explicação para uma coisa dessas! Chegamos a uma situação em que já não se sabe se é mais seguro estar vivo ou morto. Como explicar? Não se sabe. Estes crimes não nos asseguram que estar mortos é estar em paz. Definitivamente, não consigo compreender. Pra mim: é inexplicável. E soturno.

24 novembro 2008

 

Com o Prêmio Dardos reconhecemos os valores que cada blogueiro mostra a cada dia no empenho em transmitir valores culturais, éticos, literários, pessoais, em demonstrar, em suma, sua criatividade através do pensamento vivo que está e permanece intacto entre suas letras, entre suas palavras.”
Estas palavras remetem ao Blog Graça Graúna que recebeu o Prêmio Dardos, conferido por Márcia Sanches Luz. Com este prêmio recebi também o direito de homenagear 15 Blogs. Para tanto, os homenageados que desejarem exibir o selo observem o seguinte:
1- Linkar o blog do qual recebeu o prêmio.
2 - Escolher 15 blogs para entregar o Prêmio Dardos e colocá-lo em seu blog (explicando ou não o motivo da premiação) e enviar esta mensagem ou outra com seu estilo a cada um dos escolhidos, como sugere a poetamiga Márcia. Nessa perspectiva, o Prêmio vai para:

Aníbal Beça
A Amazônia é nossa
Claudia alma de poeta
Cores da palavra
Daniel Munduruku
Dhnet
Eliane Potiguara
Escritores Indígenas
Gilia Gerling
Hideraldo Montenegro
Interpoética

Linhas do desassossego
Madalena Barranco
Olívio Jekupé
Repórter Free

Com abraçares,
Graça Graúna
Nordeste do Brasil, 17 de novembro de 2008

17 novembro 2008

 


Pintura de Picasso



POR ONDE ANDAM OS GATOS?

Não que seja um animal que eu goste. Mas andei sentido falta de alguns deles no telhado de minha casa por esses meses. Gatos. Animais que julgo ser a preguiça em forma de bicho. Nunca tive vontade de criar um sequer. Salvo se fosse para que me servisse de saco de pancadas, de tapete para limpar os pés, para lançá-los à distância etc. (zoofobia?!). Havia um tempo em que entre a laje e o telhado de minha casa, juntava-se uma colônia destes bichos, e varavam a noite se acasalando sob a chuva de estrelas da primavera. Coisa que agora sinto falta, incrivelmente sinto falta. Paradoxalmente, não dos astros luminosos, mas tão somente dos gatos, ou melhor, do sofrimento e o conseqüente miado doloroso das gatas. A mim, parece que o sexo entre gatos é mais uma sessão de masoquismo animal. Penso isto ao escutar os clássicos renitentes miados que mais parecem ser gritos torcidos como se fosse o som de uma vitrola em rotação desajustada. Porém, gosto de ouvir o esganiçar felino daqueles bichos quando estão no ato amoroso. Gosto de ouvir, mesmo quando acordam minha família: minha mãe com os cabelos arrepiados pelas tantas da madrugada indo à cozinha tomar um copo d’água para se acalmar do susto que tivera depois dos primeiros sopapos no telhado. “Ah esses gatos de novo”, sentença dela. Nada que não me faça achar interessante aqueles bichos esburacando o silêncio da noite, como se houvesse mais prazer em debaterem-se sob o telhado do que propriamente sentirem o prazer entre si. Acho que os gatos preferem mais o sexo pelo barulho do que pelo prazer. Uma vizinha minha também acreditava nisso, e olhe que ela entendia bem de gatos. Criava vários. Mais que isso, cultuava-os. E eu nem chegava perto dela por causa disso. Só de raro, quando ela ia me mostrar como os capava: amarrava uma linha de nylon, presa com força nos testículos do bicho; com a outra ponta da linha, prendia em nó-quase-cego na grade do portão de sua casa: daí, fazia um susto qualquer de modo que o gato pudesse correr/arrancar em desespero. Pronto: ficava ali aquelas coisinhas murchas presa à linha: os testículos. O miado do gato fugia à linha: ganhava outro nome: o gato ficava quase rouco, esperniava, não sabia o que era anestesia. Não desistia. Passava dias amuado, quieto, num canto da casa. Após mais ou menos parcos seis dias, quando já estava desobrigado da dor da castração, ia procurar as gatas, sem saber que não mais corria o risco de emprenhá-las. Estava pronto pra fazer dos telhados seus ninhos, mesmo sob os gritos os quais as estrelas nunca reclamavam.

13 novembro 2008

 




Lançamento do livro do poeta Helder Herik


Sendo apontado como um dos poetas mais representativos da atual poesia brasileira, porém sem antes ter lançando um livro sequer, e ainda sem ter saído de sua cidade (Garanhuns-PE), chegou a hora de Helder Herik mostrar a seus leitores – que até então só conheciam seus escritos através de seu blog – o que há de mais original e notável em sua poesia. O lançamento de seu 1º livro se realizará no dia 14 de novembro (próxima sexta-feira), às 17h, no Colégio XV de Novembro, onde contará com a presença de diversos artistas e intelectuais de toda região. Intitulado AMORTE, o livro de Helder traz poemas que apresentam em si a medida certa do que deve ser um poema, ou seja, poemas sem excessos, onde nada falta nem sobra. Portanto, um livro que vale a pena ser lido, relido, apreciado e imortalizado. O lançamento de AMORTE será aberto ao público, todavia sintam-se convidados (as) a se fazerem presentes neste evento.


08 novembro 2008

 


Capa do Suplemento Cultural do Diário Oficial do Estado


Dos escritores contemporâneos

O Brasil tem nos rendido excelentes escritores – embora alguns leitores anêmicos duvidem deste fato. Dos muitos escritores contemporâneos que tenho lido, percebo que a quantidade arrebatadora dos bons são autenticamente pernambucanos. Só para citar três destes grandes do presente: Luzilá Gonçalves, Raimundo Carrero e Gilvan Lemos. Acerca deste último, tenho tomado uma paixão especial pelos seus escritos. Sobretudo pelo livro o qual atualmente estou lendo, Os pardais estão voltando, publicado em 1983, ano em que o Brasil ainda fervilhava nas mãos de uma ditadura. Transcrevo então um trecho do livro, e desde já sugiro a leitura desta grande obra deste grande escritor nascido em São Bento do Una (Agreste pernambucano):

– Veja como é devassável o trabalho do escritor, irreconhecido seu esforço, seu sacrifício de anos, meses, dias e horas de dedicação. Vem um sujeito que nunca leu um livro na vida, apanha um dos meus: Esse autor eu conheço, é de lá da minha terra. Lê-o e de imediato encontra uma infinidade de defeitos. Uma situação, por exemplo, que levou meses a ser criada em concordância com o enredo, passa-lhe de raspão pelo entendimento, recebe-lhe a crítica fulminante: Mas não pode ser assim, ninguém agiria dessa maneira.[...] Não compreendem que ao autor interessa a criação, o espírito da obra, o que lhe penetra a sensibilidade, não apenas a reprodução de fatos reais, existentes, prontamente acabados, encontradiços em qualquer cidade do interior.

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