24 dezembro 2007

 



NATAL: UMA FORMA DE (NÃO) TER MEMÓRIA



Sempre que chega o Natal e fim de ano e me proponho a escrever sobre tal, confesso que uma leve sensação de angústia me sobe aos nervos. Primeiro, porque fico dividido entre escrever sobre o que este período natalino causa na vida das pessoas – inclusive na minha – e o que não compete a eu escrever. Depois, porque parece que as palavras em determinado momento se escondem em razão de eu sentir a responsabilidade de ter que, de alguma forma, sensibilizar meus leitores com um texto que massageie o ego deles pelo fato do “tempo em que se renovam as esperanças” se fazer presente. Com isso, acabo não achando a precisão do que deveria escrever. Também não sei se eu sabendo o que deveria escrever iria lá resolver alguma coisa. Enfim, quem poderá sabê-lo?

Portanto, talvez eu pudesse resolver isso chacoteando a nossa memória... é, isso mesmo! Aquela memória saudosista que nos embriaga ao passarmos diante das lojas enfeitadas com guirlandas, alguns Noéis, sinos, estrelas, e ornamentos afins. O filósofo Nietzsche, certa vez afirmou: “a vantagem de ter péssima memória é divertir-se muitas vezes com as mesmas coisas boas como se fosse a primeira vez”. Assim é que penso: a cada Natal e Ano novo deveríamos vivê-los como se fosse a primeira vez. Como se a diversão estivesse no que ainda não fora vivido. Com efeito, acontece justamente no período natalino coisas que até então nunca se vive o ano inteiro. Contudo, são boas. E acabam sendo sarcásticas, decerto. Um exemplo bem prático disso, é no trabalho, quando às vezes existem pessoas que trabalham na mesma empresa que você, e passam os 365 dias do ano sem lhe dar um “bom dia” ou “boa tarde” e, de repente, na confraternização de fim de ano, na frente do (a) gerente vem lhe dar um abraço apertado, desejando-lhe os mais “sinceros” votos de felicidades. Ora, a felicidade, se é realmente desejada de coração, que seja desejada o ano inteiro. Se o abraço é uma forma de demonstrar carinho, que o abraço seja dado o ano inteiro. Não se precisa de palavras. Como escreveu Clarice Lispector: “verdades não têm palavras”. Não sei se as palavras poderiam vetar nossa memória.

Sabe, penso que deveria haver palavras que pudessem fazer esquecer o que vivemos. Como uma espécie de “abra-cá-dabra”. Acredito, então, que a palavra-chave para zombar de nossa memória é “paciência”. Sim, porque nossa memória sempre se rende à impaciência de remoer o que nos foi ou é bom. Além do mais, entender a paciência é entender Deus. Imaginem só o quanto um indivíduo tem que ter de paciência para tomar conta do mundo! Hum?! Veja-se Deus mesmo, sobre o que a pouco eu afirmara: Deus é feliz porque não tem boa memória. É. Pois se ele fosse um ser bem dotado de memória jamais deixaria tanto canalha escapar – ainda que fedendo – dos “quintos”. Chego à conclusão que realmente é feliz que não tem uma boa memória. Afinal, do que adianta tê-la e as coisas continuarem do jeito que são? O homem sabe, tem consciência de sua corrupção; no entanto, a confiança em seu semelhante sempre existiu. Ilustrando isto através da boa memória do povo de nosso país, poderíamos exemplificar o caso da politiquice brasileira, pois sabemos sempre quem são os picaretas, todavia o bom senso do “perdoai”, sempre nos leva a dar mais uma chance a um patife como Fernando Collor, por exemplo.
Deste modo, a falta de memória é um elixir para que não nos percamos no baú que somos. Discussões escrupulosas a parte, surge-me um embate: não sei se é piegas encerrar estas linhas congratulando vocês, meus leitores, com um “Feliz Natal a todos!”. Não, pensando bem, acho melhor não encerrar assim. Congratularei com um “Péssimas memórias a todos!” Deixeis, pois, que o “Feliz Natal” sobreviva apenas em sua forma gráfica, uma vez que o que fica escrito permanece debatendo-se. Não, não. Deixeis, mesmo, que eu deseje para meus leitores um “Feliz Natal”, que esta é a maneira mais sarcástica que eu tenho para escapar dos “quintos” e continuar me debatendo. Então a vocês, um Feliz Natal!

Comments:
"nada mais peço a deus, q o dom d esqecer" é o trecho d uma musiqinha q tenho escrito na parede do meu quarto, pra ñ esqecer... hahhahah
:p

o meu natal foi bom, graças.

e o seu?

bjoabraço.
 
Wagner, como sempre, escrevendo maravilhosamente bem. Adorei o Cap.4! Saudades...
Conscidentemente tb me caiu aos ouvidos os versos de Mário e, de alguma forma, modificaram meu modo de enxergar as coisas...

Bjs!!!
Adriana
 
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