26 janeiro 2007

 

CAMBALEANTE
Podia ser que dentro dela houvesse algo de triste. Não era certo. Pelo menos seus olhos nada denunciavam. Sequer um sopro de dor vazava de sua vista. Aparentava ter vontade de querer sair correndo dali. Mas estava ali, quieta, no seu canto. Muda. Um cigarro vez em quando, tragadas leves, baforadas sutis. Levava o copo à boca com alguma lerdeza, sem aquela pressa a qual um ladrão tem depois de um roubo. Um gole ou outro, espaçado. Passava a mão no canto dos lábios procurando extinguir a umidade da bebida. Baixava a cabeça com as mãos suspendendo o queixo, como se quisesse enterrar a cabeça na mesa, ou mesmo no cinzeiro de vidro que a sua frente ficava. Vez por outra mergulhava seu rosto nas mãos como se estivesse enfiando-o num buraco pra nunca mais tirá-lo. Era como se não houvesse nada perto de si, talvez se achasse em algum lugar vazio.

Estava ali. De quando em quando olhando pro relógio, querendo talvez engolir o tempo. O tempo às vezes é um adversário. No entanto, o movimento pausado de seus membros dava a impressão de que tudo estava em sua mais adequada velocidade. Os segundos pareciam eternidades diante de sua cara desbotada. Talvez faltasse algo mesmo. Sempre está nos faltando algo. Mas os sinais de necessidade não se mostravam fáceis. Mantinha o cenho inflexível, rijo. Olhar disperso; vez por outra, compenetrado. Fusão de sensações em um único corpo. Isolação. Estava sozinha na mesa. E não há bebida que compense a solidão de quem está só numa mesa. E tudo aos poucos em sua fisionomia parecia obedecer à quantidade de bebida consumida.

* * *

Um terço de hora passada. Após goles e mais goles. Cinzeiro entupido de bitucas. Copo caído. Seu corpo penso sobre a cadeira; de leve, jogava-se de peito de encontro à mesa. O álcool a levara a uma dormência veemente. Frouxa. Levantou-se trôpega. Arrancou do bolso seus poucos vinténs, não sabia quanto. Jogo-os na mão do garçom. Lembrou-se de que ali havia paredes, e estas, por sua vez, poderiam guiá-la a algum lugar. Mas qual? Não importaria. Saiu do bar. Cambaleante. Tinha tato. Os muros da rua poderiam levá-la. Tem coisas que sempre podem nos levar a algum lugar. Seguiu pela calçada. Andando custosamente. Respiração ofegante. Pé lá, outro cá. Arrastando-se. Velocidade de tartaruga. Ia-se embora. Sem dizer nada, não era preciso. O que quer que sentisse, só pertencia a ela, a ela apenas. Que guardasse pra si o que seus olhos não queriam - nem tampouco deveriam - denunciar. Foi-se. Sumiu na noite, que devorava as horas sem dizer nada, não era preciso.

Comments:
... lindo texto.... naum sei o que se passava com ela... mas conheço bastante a sensação!!!!

abraço!!!!!
 
muito obrigada pelo comentário, wagner!
vou te visitar mais vezes.
beijos
 
Boa linguagem. alguns lugares comuns perdoaveis, sobretudo sabendo que este é seu tipo de expressão. que é isso e nada mais trabalhado que você quer. bom texto, mas algo me pareceu solto. quando se utilaza uma forma de dizer sintética, é preciso dizer as coisas sinteticamente, e não correr aquilo que se estar dizendo. poderia ficar um texto excelente, com grande teor psicologico, se viesse a ser mais explorado. Este é um preço que se paga pela demasiada ansiedade (seria mesmo o ano passado o momento de se publicar um livro como 'Poesiurbana'? estava o livro pronto como arte ou a ansiedade é que o impulsionou?). daí a necessidade de algum intervalo entre uma postagem e outra. para que o texto vá se depurando, crescendo. virando arte e não esboço.

Suas leituras o fazem bem. sua ansiedade o mata.
 
Obrigada pela simpática visita. Vou linká-lo ao meu, pq gostei da qualidade das palavras. Ok?
Chris
www.de-ponta-cabeca.blogspot.com
 
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