12 dezembro 2006

 

A ANGÚSTIA DE LER ANGÚSTIA

Finalmente terminei de ler Angústia. Pensei que não iria terminar mais. (Afazeres acadêmicos e profissionais tornaram, de fato, angustiante o término do livro, devido ao tempo que me foi sugado). Livro travoso. Ao mesmo tempo digestível. Pude perceber todos os méritos desta grande obra de Graciliano Ramos. Para mim, dentre os vários aspectos que edificam o livro, o lirismo é - sem dúvida - o grande pilar do romance. Mas não um lirismo qualquer, e sim um lirismo que até agora só o velho “Graça” foi capaz de elaborar: um lirismo amusical, áspero, frugal, comedido, sem deságües ou sobras. Narrativa em que esse escritor alagoano trata as palavras com desvelo, como se estivesse tirando espinha de peixe. Meticulosidade com a forma.

Livro com personagens complexas. Aparentemente personagens simples. Mas a verdade é que cada personagem acaba por ser uma projeção própria da personagem principal: Luís da Silva. A sensação que esse livro causa no leitor é de frustração, insatisfação, agonia de uma vida insaciada. Ainda mais quando o narrador vai se mostrando mórbido, frio em relação ao mundo e a si mesmo.

Vou saltar, chegar ao que mais me maravilhou: o final. Simplesmente surpreendente. Graciliano envolve totalmente o leitor na composição final do Romance, ao apurar a compreensão de quem ler a trama, um convite a ser co-participante do delírio, da auto-destrutividade, da náusea, da inquietação e do sufoco que Luis enfrenta. “A réstia descia pela parede, viajava em cima da cama, saltava no tijolo – e era por aí que se via que o tempo passava. Mas no tempo não havia horas. O relógio da sala de jantar tinha parado. Certamente fazia semanas que eu me estirava no colchão duro, longe de tudo.”

Um dos livros que agora considero de maior valor literário em minha micro-biblioteca. Livro que ganhou meu apreço. Pretendo guardá-lo com carinho. Sobretudo, porque consegui extrair linhas que me dizem muito nesta fase de minha vida, a exemplo: “Vieram-me lágrimas, que esmaguei”. É tudo. Livro oportuno, na hora oportuna. Louvores a Graciliano, que soube criar bem, jogar como o mundo, gerar coisas, pessoas. Encerremos com uma de suas tacadas de mestre: “Escrevo, invento mentiras sem dificuldade”.

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