20 julho 2007

 

- COISAS QUE A GENTE NÃO PÕE O DEDO -



ALGODÕES

As nuvens são algodões
que foram semeados
no céu para que as
chuvas descansassem.

10 julho 2007

 

ATRÁS DAS GRADES!


Neste post, um trecho do livro - que no momento estou apreciando - Recordações da Casa dos Mortos, do Dostoiévsky. Esta obra representa um marco na atividade literária de Fiódor, pois a mesma subscreve o exórdio das mais preciosas páginas escritas na história da literatura, uma vez que demarca o começo de seu melhor ciclo como autor de uma prosa cheia de engenho e maestria. Este romance tem como enredo as experiências de um personagem confesso que narra suas vivências num presídio. No fluir do livro, percebe-se toda uma modulação psicológica que cintila entre as diversas práticas de comportamento no ínterim da carceragem. Assim, o leitor passa a exercer certa cumplicidade no momento em que o personagem-narrador o convida à partilha do que por ele foi vivido. Eis uma das passagens que até agora achei mais interessantes, e que faz jus ao nome que este escritor russo tem na Literatura universal:

Os polacos – havia acolá uns seis – eram temperamentalmente arredios e solitários. Alguns eram cultos; sobre eles ainda virei a falar, principalmente sobre os de categoria melhor. Foi por intermédio destes que, nos últimos anos de reclusão, arranjei uns livros. O primeiro que li me produziu uma impressão singular, enorme e diferente. Referir-me-ei a tais impressões mais adiante. Para mim tiveram grande interesse; acho, porém, que em quaisquer outras pessoas nada demais despertariam. Coisas há que a gente, não as tendo experimentado, não pode avaliar. Resumo assim: os sofrimentos morais são muitos mais duros de suportar do que os físicos. O homem atrasado, ao entrar para o presídio, se vê num meio às vezes superior ao que vivia antes. Naturalmente se vê privado de muita coisa: da sua terra, da sua família, de tudo quanto lhe era mais querido: mais o meio é o mesmo. Já o homem culto, que a lei puniu com o mesmo castigo, se ressente de muito mais coisas; vê-se tolhido de todos os seus hábitos e necessidades, tem de se afazer a um meio que repugna, tem de aprender a respirar uma atmosfera muito outra... É como peixe jogado na areia... E para ele o castigo, que a lei considera igual para todos, se torna um tormento dez vezes exacerbado. Esta é a verdade! Mesmo sem se falar no sacrifício dos hábitos materiais.”

04 julho 2007

 



OS CHÃOS E AS MANEIRAS DE ESCAVAR


...às vezes tenho essa necessidade de encontrar chãos dentro de mim. Chãos, isso mesmo – no plural. Chãos. Desacredito que o ser humano tenha um apenas. Cada uma de nós, por viver imerso em nossas próprias agonias, sente a necessidade de escavar essa crosta inóspita que se chama Alma. Mas não que eu procure em mim o que desconheço. Procuro em mim o que sei que tenho, mesmo sem saber que tenho coisas que perco no momento em que encontro. Daí então é que surge essa agreste necessidade de ralar meu corpo na superfície de mim mesmo, até o solo ralo acusar que os chãos são poucos frente à singularidade que é desfeita diante do que escavo e movo. Descubro poucos chãos em mim. Chãos que sequer cedem suas peles ao orifício de um alicerce ou um encosto. Os chãos em mim nem ao menos cospem poeira – chuva de terra em pó. ...o chãos que planifico não dão espaço às paredes, não revelam tetos, não acolhem portas, janelas; encerram-se apenas em si mesmos, como se cada medida de suas estreitezas findasse qualquer possibilidade de alargar terrenos irregulares.

Brotam em mim chãos como se fossem céus desabando. Contudo, não tenho certeza de que as vibrações desses chãos que encontro são terremotos que acordam ou mesmo são vulcões que dormem. Pois, em cada sono do tremor que me surge, percebo o cochilo atribulado do que desperta os meus desejos mais incofessáveis. Meus desejos são poucos diante do que provoca esse medo que desconheço. E desconheço tão somente por julgar divertido a sensação mordaz causada pelo medo de pisar onde meus pés não alcançam nem tampouco ousam pisar. Encontro chãos diversos. Adversos. Chãos que não instalam ao menos uma gota do que sonda a secura veranil. ...os chãos que me despertam são incontáveis. Porque contar é incorrer à crueldade de delimitar coisas em números. Por isso, contar me cansa, sobretudo no momento em que os números retiram de mim qualquer possibilidade de errar a quantia. Toda quantia traz em sim a importância de valores. E eu apenas me valho dos valores dos lugares que desconheço. Desconheço tão somente por não poder odiar nem amar os chãos que piso, as Almas que procuro, os corações que escavo.

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